Diferentes correntes teóricas coincidem na caracterização da cidadania a partir de três dimensões: a identidade coletiva, de caráter nacional; a capacidade de participar na tomada de decisões institucionais e políticas; e o estatuto jurídico do vínculo pelo qual o indivíduo está unido ao grupo social. Atualmente, essa definição vem se transformando em decorrência do aumento das correntes teóricas cosmopolitas (associadas a uma concepção universalista de cidadania, que transcende as fronteiras nacionais) e do maior reconhecimento do multiculturalismo e da diversidade das sociedades, entre outros fatores que exaltam esta noção, à luz dos processos históricos mais recentes.
Ao mesmo tempo, ao longo da história, o conceito de cidadania vem se expandindo, partindo de sociedades em que mulheres, estrangeiros e escravos não eram considerados cidadãos, como ocorria na antiguidade.
A ideia de cidadania remonta à antiguidade clássica: desde as suas origens, era uma noção ligada ao conceito de democracia, no contexto da polis grega. Sob o modelo da democracia ateniense, o povo (demos) intervinha diretamente nos assuntos públicos, por meio da participação dos cidadãos em órgãos públicos, como assembleias e tribunais. Deve-se notar que apenas homens adultos livres, pertencentes às classes altas, eram considerados cidadãos.
Durante vários anos —especialmente no tempo de Péricles—, a democracia em Atenas foi radicalizada, tendendo a uma identificação entre o Estado e os cidadãos, de tal forma que a Assembleia Popular assumiu as funções dos três poderes, o Executivo, Legislativo e Judiciário.
No campo da filosofia, Aristóteles estabeleceu uma ideia fundacional de cidadania, ao definir o ser humano como um animal político, ou seja, cuja vida está entrelaçada com o futuro da comunidade a que pertence. O cidadão, nesse sentido, é definido por sua participação na administração da justiça e no governo de sua comunidade. Ao mesmo tempo, como contrapartida, são reconhecidos os direitos de cidadania (voz e voto nas assembleias, participação em atividades religiosas, proteção da lei, direitos de propriedade, entre outros) e obrigações (defesa da comunidade, pagamento de impostos, etc.).
Em linhas gerais, as características da cidadania grega foram mantidas sob o modelo de Roma. No entanto, esta foi estendida aos estrangeiros de territórios conquistados, embora com certas restrições (por exemplo, eles não podiam participar de decisões públicas).
Após a queda de Roma, na época medieval, a cidadania perdeu sua relevância como elemento estruturante da vida pública da comunidade, paralelamente à queda da democracia como sistema de governo, que foi substituída por sistemas de governo mais de cima para baixo. A ordem hierárquica imposta pela Igreja Católica contrariava a ideia de cidadania, na medida em que o poder eclesiástico se confundia com o poder político.
Com o renascimento da democracia, por volta do século XVIII, a cidadania torna-se novamente relevante, resultando em um conceito decisivo no surgimento do republicanismo e do liberalismo. Junto com as Revoluções Burguesas, o sistema jurídico das sociedades ocidentais se transforma como consequência do desenvolvimento das forças produtivas que, para aprofundar a acumulação capitalista, requer uma reestruturação do trabalho. Assim, o proletariado surge como uma classe social composta por trabalhadores livres, que se integram à sociedade civil como parte da cidadania. Com a Revolução Francesa, é ditada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), na qual se conformam os direitos civis universais, como os conhecemos hoje.
Ao longo dos séculos XX e XXI, houve uma série de extensões em três áreas do direito: direitos civis, direitos políticos e direitos sociais e econômicos (por exemplo, o reconhecimento do direito ao sufrágio feminino). As referidas modificações são dinâmicas, o que implica que a noção de cidadania permanece aberta a transformações, conforme as demandas sociais pela ampliação dos direitos, bem como, ao contrário, é suscetível à restrição destes últimos sob governos autoritários.
Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Setembro 2022). Conceito de Cidadania. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/cidadania/. São Paulo, Brasil.