Conceito de Justo

Lilén Gomez | nov. 2022
Professora de Filosofia

Justo pode referir-se tanto à descrição de um sujeito, que dizemos agir de acordo com a lei, quanto à caracterização de uma situação ou ação, em que a legalidade prevaleça nos fatos ou entre as partes envolvidas. O que é justo, em todo caso, refere-se à noção de justiça, que costuma estar associada à adaptação às normas públicas estabelecidas.

Justo e justiça

Ao longo da história, a justiça esteve associada ao campo da legalidade. Na antiguidade clássica, os gregos entendiam o que era justo como o que era adequado ao sistema jurídico. Por sua vez, por exemplo, na formulação platônica, a dita ordem jurídica para ser legítima tinha que se ajustar à harmonia universal, segundo a qual se forma a unidade entre o indivíduo, a polis e o cosmos.

Mais tarde, já nos tempos modernos, o justo será considerado em sentido análogo. Tomando como referência o contratualista Thomas Hobbes (1588-1679), o justo é tudo aquilo que cumpre os acordos previamente celebrados. Assim, a justiça é, fundamentalmente, aquilo em que se baseia o pacto social ou, na perspectiva de John Locke (1632-1704), a justiça estaria relacionada à aplicação positiva da legalidade racional, ditada pela natureza.

Desde meados do século XX, após as Guerras Mundiais e os grandes genocídios ocorridos naquele século, a justiça como problema ético ganhou grande relevância na ordem prática da vida comunitária. Para o pensamento contemporâneo, a questão da justiça é indissociável do respeito à alteridade, em todas as suas formas de existência.

A teoria de “justo-meio” de Aristóteles

Em sua obra Ética a Nicômaco, Aristóteles (384 aC – 322 aC) recorre ao conceito de mesótes, que traduzimos como justo-meio, para descrever a virtude, como aquilo que está equitativamente distante dos extremos, identificado com o vício. Um homem é justo, do ponto de vista do filósofo, quando pratica a virtude plena para si e em suas relações com os outros, então a justiça é o ponto em que todas as virtudes convergem.

Na obra aristotélica são apresentados diferentes tipos de justiça. De modo geral, a justiça é a adaptação às leis e seu fim é a felicidade da comunidade, que nesse sentido, é total. No entanto, há também uma justiça parcial, que diz respeito a diferentes aspectos da vida social. Esta, por sua vez, divide-se em duas classes: justiça distributiva (que diz respeito à distribuição de benefícios entre todos os membros da sociedade) ou comutativa (caso regule os contratos entre indivíduos).

Aristóteles entende a justiça social como uma forma de igualdade entre os homens. Do ponto de vista político, a justiça é o bem da comunidade.

O justo como práxis ética

Embora o filósofo contemporâneo Paul Ricouer (1913-2005) não tenha desenvolvido sistematicamente a noção de justiça em sua obra, o conceito de equidade, no qual se cruzam as dimensões da ética, da legalidade e da política, foram o centro em sua teoria. Ricoeur propõe um deslocamento, justamente, da categoria da justiça para a de justo, na medida em que a justiça, como universal, tem caráter metafísico, ou seja, se apresenta como atemporal e essencial.

Por outro lado, Ricouer pensa o justo a partir de uma perspectiva histórica, de acordo com a configuração da cidadania em diferentes contextos. O justo, então, é o resultado da sabedoria prática voltada para o bem viver, no marco da ética pública aplicada ao contexto particular de cada comunidade cidadã.

A dimensão do público, constitutiva da noção ricoeuriana de justo, implica que tal noção deve ser pensada dentro de um esquema dialógico e relacional, no qual o outro ocupa um papel decisivo (de onde surge sua crítica à perspectiva hobbesiana de justiça, que considera o outro como uma ameaça), e não em termos de justiça absoluta, com pretensões de ser válida para qualquer povo. O ponto de partida para um pensamento sobre o que é justo é, desse ponto de vista, a sensibilidade para o que é injusto, o que mobiliza a questão de uma práxis de vida mais justa.

Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.

Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (nov., 2022). Conceito de Justo. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/justo/. São Paulo, Brasil.

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