Na linguagem cotidiana, legitimidade é o que torna uma determinada ação ou decisão razoável ou justa. Nas disciplinas associadas à política —tal como, Filosofia Política, Ciência Política, Direito—, a noção de legitimidade adquire um significado específico, geralmente referindo-se às ações do Estado.
O poder do Estado é basicamente legitimado quando uma grande parcela da população oferece um grau de consenso que garante a obediência, portanto, para sustentar tal ordem de coisas, a força física só é usada em casos particulares. Sendo assim, o interesse do poder reside sempre na geração do consenso, para conseguir uma adesão à obediência tal que se torne legítima. O caso específico da legitimidade no contexto do Estado depende, por sua vez, da noção em vigor de legitimidade, uma vez que o consenso gerado a mando da população depende se esta considera justas ou razoáveis as ações de poder que se registram no nível estadual.
A legitimidade real de um Estado, na prática, depende de uma multiplicidade de fatores. Isso é condicionado pela forma como se dispõem os diferentes elementos que compõem o Estado como um todo: a comunidade política, o regime, o governo e o Estado hegemônico, quando este é um Estado não independente. Conforme se articulam esses fatores, variam os processos de legitimação do Estado.
Já a comunidade política é constituída pelo grupo social formado por indivíduos que realizam trabalho político. Logo, a legitimidade, nesse aspecto, configura-se de acordo com a identificação e fidelidade da população para com a comunidade política. No caso do regime, é o conjunto de instituições que regulam o exercício do poder, de acordo com diferentes princípios (monárquico, democrático, socialista, etc.) e, assim, a legitimidade do regime depende do grau de adesão a tais princípios, independentemente de quem esteja ocupando circunstancialmente essas instituições. Em outras palavras, a aceitação do regime lança as bases para a disputa entre grupos políticos pelo acesso ao poder, conferindo-lhe um marco regulatório comum.
Por sua vez, o governo é o exercício concreto do poder político, na forma do regime instituído, sendo este legítimo quando age de acordo com as normas estabelecidas para a vida política. Entretanto, a legitimidade do governo pode se dar por outros motivos, por exemplo, pelas qualidades pessoais de seus dirigentes. Finalmente, considerando um Estado não independente, no contexto de um país colonizado, é difícil para a população considerar o Estado legítimo, uma vez que não toma decisões autônomas e, neste caso, a adesão pode ser dada ao sistema imperial do qual faz parte.
Os papéis da população nos processos de legitimação de um Estado podem ser diversos e, geralmente, dependem do nível de coerência entre o fundamento ou propósitos do poder e seu próprio sistema de valores e crenças. Caso ambos os elementos sejam compatíveis, o resultado será a legitimidade do Estado. Por outro lado, se forem contraditórios, o resultado é uma contestação à legitimidade do Estado, que se traduz numa ação cujo objetivo é transformar as bases da vida política, isto é, mudar o regime ou a comunidade política.
O desafio da legitimidade transcende a oposição ao governo, na medida em que se dirige à transformação das próprias estruturas políticas e não apenas ao afastamento de quem as administra. Nesse sentido, é considerada uma atitude de rebelião —quando a ordem estabelecida é negada— ou de revolução —quando uma nova ordem social é proposta.
Qualquer luta pela legitimação de uma ou outra ordem é atravessada pela ideologia dos grupos sociais em conflito, cujos interesses são diversos, tornando-se antagônicos. O poder atinge a sua estabilidade quando consegue cumprir as funções que lhe foram atribuídas (por exemplo, o desenvolvimento económico ou a defesa do corpo social), de modo a justificar a sua própria existência.
Porém, quando os fundamentos sobre os quais repousa o poder se desvinculam da realidade social, então eles são abandonados e ocorre uma crise, que leva à transformação da estrutura até então vigente, de modo que uma nova legitimidade se recomponha rumo a uma ordem social diferente.
Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.
Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Agosto 2022). Conceito de Legitimidade. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/legitimidade/. São Paulo, Brasil.