O verbo “perceber” deriva do latim percipĕre, que é interpretado como “receber”, “sentir” ou “apoderar-se algo”. Na linguagem comum, a percepção consiste na sensação que corresponde à impressão dos sentidos sobre uma coisa, quando experimentada.
Geralmente, é usado como sinônimo de sensação, sentimento, impressão ou representação, porém, no vocabulário técnico das ciências —sociais e exatas— e das humanidades, cada uma delas tem um significado específico dentro de diferentes correntes teóricas. Deve-se notar que o termo percepção pode se referir tanto ao ato de perceber quanto à coisa percebida. Por sua vez, o ato de perceber pode ser interpretado tanto como uma resposta passiva da mente humana a um estímulo externo, quanto na forma de um processo ativo, onde há uma ação por parte do sujeito que percebe.
A percepção, sob as formulações do empirismo filosófico, é um dos pilares fundamentais para a construção do conhecimento. Em linhas gerais, o empirismo clássico pressupõe que a percepção implica uma elaboração incipiente, por meio de mecanismos de associação, das impressões que a mente recebe passivamente.
No pensamento de David Hume (1711-1776) —um dos principais fundadores do empirismo, que retomou as ideias de outro renomado empirista, John Locke (1632-1704)—, a percepção é entendida como tudo o que se apresenta na mente, seja pelos sentidos ou seja como resultado da ação do pensamento e da reflexão. Nesse sentido, as percepções são caracterizadas por existirem para uma mente ou um sujeito capaz de sentir e pensar.
Por sua vez, as percepções, de acordo com o grau de vivacidade com que aparecem diante da mente, são classificadas como impressões (quando são mais vívidas) ou ideias (que aparecem como imagens mais fracas diante do pensamento). Desta forma, todas as ideias são derivadas da impressão. Por outro lado, as percepções também podem ser classificadas de acordo com seu nível de complexidade, em simples e compostas, dependendo de admitirem ou não divisão.
Finalmente, as impressões são classificadas como sensações (quando são imediatas) ou reflexões (quando são mediadas por ideias), e as ideias são divididas em ideias da memória ou da imaginação. Para serem válidas, nossas ideias devem sempre ser derivadas de simples impressões, no entanto, a imaginação é capaz de combinar ideias simples formando ideias complexas que podem ser fictícias (por exemplo, geramos a ideia de um unicórnio juntando a ideia simples de um animal com um chifre na testa e a de um cavalo).
Sob a perspectiva da chamada virada copernicana introduzida por Immanuel Kant (1724-1804) na teoria do conhecimento de sua época, o filósofo recupera em grande parte a herança empirista de Hume e Locke, mas ao mesmo tempo, ele dirige sua teoria contra a concepção do uso da razão como meramente limitado à associação de ideias derivadas passivamente da experiência. Para Kant, o entendimento não apenas ordena as representações, mas também participa ativamente de sua constituição, segundo categorias transcendentais. O momento da percepção, portanto, não consiste em uma afetação totalmente passiva do intelecto, mas nele opera uma espécie de consciência empírica, que molda a experiência. Sem essa operação, a própria percepção seria impossível, pois resultaria em um caos de impressões sem referência a qualquer sujeito pensante.
O filósofo francês Maurice Merleau-Ponty (1908-1961) trabalhou profundamente a noção de percepção ao longo de sua obra, em discussão com a tradição dualista que separava a mente do corpo em duas ordens diferentes, priorizando a primeira sobre a segunda. Na fenomenologia de Merleau-Ponty, o corpo encarna a consciência cognitiva, de tal forma que um e outro se entrelaçam mutuamente. A percepção já é significativa, antes mesmo da reflexão teórica e, nesse sentido, há uma inteligência corporal que opera na percepção sem que haja subordinação ao intelecto.
Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.
Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Outubro 2022). Conceito de Percepção. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/percepcao/. São Paulo, Brasil.