Conceito de Anarquia

Lilén Gomez | Março 2023
Professora de Filosofia

A palavra anarquia vem do grego ἀναρχία (anarchía), a partir do prefixo an-, na forma ἀ- (a-), que indica ‘negação’, sobre a base de ἀρχή (archḗ), como ‘primeiro’, no quadro de uma figura de liderança, de modo que o resultado do composto expressa ‘contrário à autoridade’, ou ‘sem governo’. Na Grécia clássica, a palavra se referia a comunidades sem uma cabeça, ou seja, que não estavam sob o domínio de líderes militares. Mais tarde, sob o domínio romano, grupos sociais fora do controle do império seriam chamados de “anarquistas”.

Nos tempos modernos, por volta do século XVI, o termo anarquia começa a ser usado, pejorativamente, em referência às formas de organização das sociedades não colonizadas pelas principais potências europeias, caracterizadas como “primitivas” ou “selvagens”, em regiões da América latina, África e parte do mundo islâmico.

Da mesma forma, os habitantes do meio rural também foram considerados “elementos anárquicos”, por estarem geograficamente distantes dos principais centros civis, identificados com a cultura e o desenvolvimento social. Progressivamente, o uso do termo se difundiu como uma caracterização pejorativa daqueles que representavam uma ameaça ao poder das autoridades, isto é, a Igreja e o Estado. Nesse sentido, a noção de anarquia é construída, ao longo da história, como o oposto do mundo “civilizado”, encarnado pelos Estados da Europa Ocidental.

O anarquismo como filosofia política

O anarquismo, como filosofia política sobre os modos de organização da sociedade, refere-se a um conjunto de teorias que rejeitam os fundamentos da autoridade hierárquica de alguns homens sobre o todo, razão pela qual se opõe tanto à autoridade do Estado quanto à autoridade eclesiástica. As críticas subjacentes à proposta de abolição dessas instituições visavam questionar os abusos e o autoritarismo que estavam em suas bases. O anarquismo não suportava o questionamento de nenhuma ordem social, em favor do “caos” e da desorganização mas, em contrapartida à oposição aos princípios do governo, acreditava que outras formas de organização territorial poderiam ser articuladas, sob outros princípios, como a solidariedade e o apoio mútuo.

Na base da crítica às instituições políticas e eclesiásticas, estava a crítica econômica ao modo de produção pré-capitalista e, posteriormente, ao capitalismo já consolidado. Nesse sentido, afirmou-se que o anarquismo não era uma utopia, mas sim uma proposta baseada em práticas já existentes na sociedade, na tomada de decisão descentralizada e no cooperativismo. Ao longo da história subsequente, o anarquismo foi tomado como bandeira pela classe trabalhadora em diferentes partes do mundo.

Pierre-Joseph Proudhon (1908-1865), Mijail Bakunin (1814-1876), Piotr Kropotkin (1842-1921), Errico Malatesta (1853-1932), são considerados autores clássicos do anarquismo.

Princípios econômicos do anarquismo

O objetivo final do anarquismo, que é compartilhado com o materialismo histórico elaborado por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), é a abolição das classes sociais. No entanto, existem diferentes posições sobre como deve ser o regime de propriedade na sociedade.

A primeira doutrina que se tornou majoritária na questão econômica foi o mutualismo de Proudhon, cujo principal pressuposto é a negação da propriedade, embora não da posse, ou seja, todos têm direito ao que produziram, por meio do trabalho, mas não de guardar para si o que vai além do uso. A propriedade privada consiste em roubo, pois implica uma apropriação ilegítima de bens materiais, e é a causa da desigualdade que deriva, então, do despotismo. Todo trabalho humano depende da força coletiva de toda a comunidade, portanto, a propriedade é sempre coletiva, nunca pode ser individual. O fundamento do mutualismo é a livre associação de produtores, que trocam entre si os meios de subsistência.

Em um segundo momento, foi adotado o coletivismo de Bakunin, que tem como princípio fundamental que, desde que cada homem trabalhe de acordo com sua capacidade, recebe uma parte do que é produzido de acordo com seus méritos. Assim, a terra e os meios de produção devem ser comuns, enquanto o que é produzido deve ser distribuído de acordo com o mérito de cada trabalhador.

Por fim, em um terceiro momento, prevaleceu o anarcocomunismo de Kropotkin, substituindo o caráter meritocrático do coletivismo, tendo como princípio que cada homem deve trabalhar de acordo com sua capacidade, mas deve receber, em troca, apenas o suficiente para cobrir suas necessidades. O critério de distribuição, então, é dado pelas necessidades genuínas de cada membro do grupo.

Imagem: iStock. carterdayne

Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.

Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Março 2023). Conceito de Anarquia. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/anarquia/. São Paulo, Brasil.

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