Conceito de Subjetividade

Karina Mora Mendoza | Janeiro 2023
Doutora em História

A partir de uma apreciação ampla, a subjetividade abrange todos aqueles significados que um sujeito cognoscente -aquele que conhece- internalizou sobre o mundo que o cerca (objetos, seres, espaços, ideias). A subjetividade é a carga do contexto cultural, social, político, ideológico, econômico, familiar e global que permite ao indivíduo apropriar-se de algo conhecendo-o através dos filtros que o situam em um momento específico no espaço e no tempo.

Princípios e alcance do termo

Existe a impossibilidade de apreciar um pôr do sol, por exemplo, sem o conhecimento prévio e elementar de que existem “coisas” que chamamos de “céu”, “sol”, “luz” e fenômenos naturais, leis físicas e leis de rotação e translação da Terra que nos permitem perceber porque é que podemos observar o sol “perdido” no horizonte. Para que esse momento de compreensão fosse alcançado, foi necessário que o sujeito que está conhecendo, ou seja, observando aquele pôr-do-sol, pudesse caracterizá-lo por meio da linguagem e isso só foi possível com experiências anteriores de abordagem de informações onde aprendeu tais questões: primeiro a codificar e decodificar uma linguagem, depois com a educação formal -escola-, ou ainda pelos saberes que os indivíduos apreendem no primeiro núcleo social a que estão expostos, a família. Esse seria um dos múltiplos filtros que um sujeito internalizou, como um par de óculos que não consegue tirar do rosto.

No entanto, esse conhecimento torna-se único para cada indivíduo quando, por exemplo, se observa uma criança que ainda não sabe se expressar oralmente ou por escrito e que, embora possa estar ciente -através dos sentidos- da existência desse fenômeno que seu ambiente chama de “pôr do sol”, ele não consegue traduzi-lo em um tipo de conhecimento que ele compreenda plenamente. Com este exemplo é possível falar sobre como a subjetividade de um adulto é completamente diferente da subjetividade de uma criança que não fala, já que o mundo que os marcou foi profundamente diferente e, portanto, as possibilidades que os determinaram entender seu ambiente são radicalmente diferentes. Assim, a carga subjetiva será diferente entre um avô na Índia e um adolescente latino-americano.

Somado a isso, pode-se falar de um nível mais profundo de subjetividade, em que dois sujeitos que possuem a mesma informação internalizada por meios semelhantes permitem conhecer e identificar algo da mesma forma, por exemplo, uma aula de educação formal na escola que lhes permite compreender que estão situados diante de um pôr do sol. Porém, existe a possibilidade de que a sensação que cada um tem sobre o que está vivenciando através de seus sentidos físicos e que filtraram através da informação que lhe permite nomear o que está conhecendo como “sol”, “céu”, “pôr do sol” ” é completamente diferente. Isso pode ser resultado das infinitas possibilidades que, além das informações sobre o pôr do sol que cada um possui, sua história de vida se constituiu em suas histórias pessoais.

É provável que um deles fique fascinado por assistir a um pôr do sol porque esse evento o ancora em um momento de sua infância com seu pai, já que era uma atividade que eles faziam juntos e ele registrou em suas informações neurais como “bom”, “bonito” ou “agradável”.

O outro, por outro lado, pode odiar ver o sol se pôr no horizonte porque aquele momento o lembra da privação econômica do núcleo familiar onde a eletricidade nunca poderia ser paga e, portanto, o pôr do sol o leva para um momento desconfortável, que o confrontou com o difícil momento de resolver o cotidiano no escuro. Isso é subjetividade, os milhares de filtros que um indivíduo usa para conhecer e se apropriar do mundo e emitir um julgamento único sobre ele.

Como você trabalha e o que implica a subjetividade na história?

É um assunto de debate tão extenso quanto a própria existência humana. Isso se deve às diferentes abordagens historiográficas -isto é, à maneira de escrever a história-, que ora ponderaram a subjetividade como elemento vital da escrita, ora a descartaram como obstáculo para alcançar a verdade histórica.

Como a subjetividade está presente no agente individual da história e também naquele que a escreve profissionalmente, é preciso compreender a referência precisa para se ter uma ideia crítica sobre o assunto.

Assim, cada ser humano na terra configurou uma história de vida que lhe permite olhar para o seu ambiente de uma maneira particular e, portanto, descrevê-lo de uma determinada maneira. A mesma coisa acontece com a História. Quando alguém interessado no passado quer se aprofundar na compreensão de algo; uma ideia, um acontecimento, um objeto, uma guerra, uma fábrica, uma cidade entre tantas outras coisas, tem implantado o seu próprio filtro, os seus próprios vidros que o farão conhecer esse passado de uma forma muito particular. A subjetividade na história não só é impossível de erradicar, como é essa característica que constrói as diferenças entre as histórias sobre o mesmo objeto e as torna peculiares e distintas para cada historiador. Isso não representa uma motivação para falsificar eventos e especular sobre eventos que não têm como ser verificáveis ​​e, assim, criar falsas fontes de informação para a construção histórica, mas convidam a pensar que a sensibilidade do historiador se reflete necessariamente em sua abordagem para aquela história que você quer saber.

Uma questão ainda mais importante na construção histórica diz respeito justamente às fontes que são o primeiro insumo ou suporte para abordar o passado. Ou seja, o que os historiadores do presente utilizam como forma de conhecer o passado, é uma fonte, que em si é constituída por sua própria subjetividade. Cada documento, história, pintura, fotografia, edifício, filme, romance, livro, testamento ou jornal de um momento passado, tem na sua estrutura e constituição a carga de uma subjetividade que antecede a nossa, colocando-nos assim perante a construção de um relato histórico, primeiro com nossa própria subjetividade e depois com a subjetividade da fonte. Ao fazer um testamento, por exemplo, para revisar um histórico familiar, é preciso levar em conta a subjetividade do homem que redigiu aquele documento.

Para fazer uma hermenêutica do mesmo, deve-se ter em mente que foi redigido sucessivamente por um advogado, um tabelião, um tabelião ou pelo próprio homem ou mulher -o testador- que organiza e distribui seus bens. Em qualquer uma dessas versões, o documento estará carregado de múltiplos níveis de análise que permitem conhecer esse passado, mas o passado não como uma forma única de realidade, mas o passado como as múltiplas realidades que cada um dos atores submete a esse momento e espaço-tempo que eles viam como realidade.

Se o testamento foi redigido por um advogado, com certeza boa parte do corpo textual estará ligada a locuções e tecnicalidades necessárias para dar legalidade à disposição do testador. Se o testamento fosse redigido em 1798, sem dúvida, seria diferente do que em 1934. A cada momento as disposições legais seriam diferentes e o mesmo aconteceria com a forma de redacção do testamento. E ainda, uma vez cumpridas todas as formalidades, aquele testamento teria características únicas e especiais para discorrer sobre a morte de um testador e a disposição de seus bens que eram exclusivos daquele advogado e não de outro. De tal forma que os historiadores têm como conhecer o passado pelos olhos de outros que viram o mundo que queremos conhecer a partir do presente.

Artigo de: Karina Mora Mendoza. Graduado em História pela UMSNH, Professora e Doutora pelo Colégio de Michoacán. Realiza pesquisas históricas sobre o século XIX em relação ao discurso e uso dele em temas como a história das mulheres e a construção da Nação.

Referencia autoral (APA): Mora Mendoza, K.. (Janeiro 2023). Conceito de Subjetividade. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/subjetividade/. São Paulo, Brasil.

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