Conceito de Memória Coletiva

Lilén Gomez | Junho 2023
Professora de Filosofia

A memória coletiva é o processo social de reconstrução do passado realizado por um determinado grupo, que compartilha uma experiência comum em torno do período correspondente. Este conceito foi desenvolvido em primeira instância pelo sociólogo francês Maurice Halbwachs (1877-1945), cujas ideias foram condensadas em sua obra “A Memória Coletiva”, publicada postumamente em 1950.

Os grupos sociais constroem uma identidade comum a partir da produção de uma memória coletiva, ou seja, de uma constante reconstrução de suas memórias, por meio de diálogos cotidianos, acontecimentos marcantes, monumentos, usos e costumes. Assim, todo grupo social garante sua homogeneidade ao longo do tempo por meio da memória como elemento que se mantém nas mudanças.

Memória individual vs memória coletiva

O fenômeno da memória, mesmo quando se trata de lembranças individuais, contém uma dimensão coletiva, pois está sempre estruturado em quadros sociais. Nossas memórias tornam-se mais confiáveis na medida em que compartilhamos nossas memórias com os outros. Quando evocamos certas memórias junto com outras pessoas, elas são revividas com mais força do que quando o fazemos sozinhos.

No entanto, mesmo quando as nossas próprias memórias não são partilhadas com os outros, elas permanecem de certa forma coletivas, porque construímos a nossa memória a partir de experiências mais ou menos semelhantes dos outros, já conhecidas através dos outros. E, em última instância, porque necessariamente recorremos à linguagem comum para articular o próprio processo de memória. Dessa forma, o exemplo citado por M. Halbwachs é o de um homem que chega pela primeira vez em viagem a Londres e, ao caminhar pelas ruas, mesmo quando está sozinho, lembra-se de anedotas e histórias de outros homens. Tais histórias, de uma forma ou de outra, mesmo que seus autores não estivessem presentes, acabariam influenciando a forma das memórias do viajante. Nesse sentido, o autor afirmará que as testemunhas, ou seja, os demais indivíduos que testemunham determinado fenômeno, não precisam necessariamente estar presentes material e sensivelmente para que a memória do indivíduo seja uma memória coletiva.

As imagens sobre um fato que conhecemos graças a outros transformam nossas impressões, mesmo que reproduzam o passado de forma imprecisa. Isso se deve ao fato de que nossa memória não é uma tábula rasa, ou seja, não se constrói a partir de um grau zero de memória, mas sim retoma, justamente, lembranças (inclusive ficções) que não são nossas em um sentido individual. No entanto, as influências sociais costumam passar despercebidas pelo sujeito, que considera suas memórias como puramente pessoais. Embora a memória individual nunca esteja fechada ao todo, há diferenças entre ela e a própria memória coletiva, na medida em que esta agrupa memórias individuais, sem se confundir com elas.

Diferença entre Memória Coletiva e Memória Histórica

O que diferencia a memória coletiva da memória histórica é que a primeira está mais interessada nas experiências do grupo social sobre um dado fenômeno do que na reconstrução dos fatos que o compõem. Nesse sentido, enfoca os sujeitos que passam por determinadas experiências e suas formas de construir uma identidade comum a partir delas —que permanece nas mudanças—, mais do que estudar as transformações dessa sociedade ao longo do tempo. Muitas vezes, a aspiração da memória histórica é dirigida a estabelecer-se como uma história objetiva (embora só possa sê-lo na aparência), ao passo que, quando falamos de memória coletiva, estamos sempre falando da memória do ponto de vista de um grupo.

Se para a memória coletiva a principal fonte são as memórias e experiências de grupo, no caso dos relatos históricos valorizam-se outros tipos de fontes, ligadas ao registo dos acontecimentos, a partir das quais o passado é sistematicamente reconstruído. Na memória coletiva não encontramos essa sistematicidade, mas trata-se de um discurso bastante vago, pois, ao contrário da história, não reivindica rigor científico.

Imagem: Fotolia. rob z

Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.

Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Junho 2023). Conceito de Memória Coletiva. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/memoria-coletiva/. São Paulo, Brasil.

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