Conceito de Qualidade de Vida

Lilén Gomez | Março 2023
Professora de Filosofia

A qualidade de vida refere-se a um conjunto de variáveis quantificáveis através das quais se propõe determinar, segundo um índice previamente estabelecido, o nível de bem-estar dos seres humanos de uma determinada população. É uma noção interdisciplinar, que abrange várias áreas não só em termos de estudo, mas também em termos de aplicação, que vão desde as Ciências Sociais —como a Sociologia, as Ciências Políticas ou o Serviço Social—, até o campo das Ciências Médicas e a saúde integral das pessoas, como esfera de intervenção de grande relevância.

Fatores que determinam o nível de qualidade de vida

A Organização Mundial da Saúde (OMS) caracterizou a qualidade de vida como a percepção que cada indivíduo tem sobre sua posição na vida, dentro de um contexto cultural e de um sistema de normas e valores específicos, e em relação aos seus próprios valores, metas e expectativas. Segundo a OMS, a qualidade de vida é determinada por seis variáveis fundamentais que afetam cada sujeito: estado físico e psicológico, níveis de independência, relações sociais, crenças pessoais e relação com o meio ambiente.

A ideia de qualidade de vida está relacionada à de saúde integral, ou seja, não se restringe à mera ausência de doença, mas esta associada à garantia de acesso aos Direitos Humanos universais, ou seja, acesso à alimentação, a um ambiente saudável, habitação, emprego, educação, entre outras dimensões. Por sua vez, a determinação da qualidade de vida não depende apenas de variáveis padronizadas, mas, principalmente, da autodeterminação pessoal.

Origens do conceito de qualidade de vida

A noção de qualidade de vida teve origem nos Estados Unidos, no contexto do pós-guerra após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Por volta da década de 1960, seu uso difundiu-se entre cientistas sociais e psicólogos, que encontraram resultados relevantes em suas pesquisas baseadas na utilização desse conceito para a análise do bem-estar da sociedade. Isso ocorre no marco da consolidação do modelo socioeconômico desenvolvimentista, de cunho keynesiano, sob o chamado “Welfare State” que traduzimos como “Estado de bem-estar”.

No início da década seguinte, o conceito se instalou em outros países ocidentais, como consequência da busca de explicação para o conflito social nos países desenvolvidos, nos quais, apesar de registrarem altos níveis de produção e consumo, não garantia satisfação social. No caso das principais potências mundiais, a ideia de bem-estar alicerçada na capacidade de consumo da população tinha-se traduzido, na prática, num aprofundamento do individualismo e do consumismo, enquanto, em diversos lugares do planeta, a maior parte da população carecia de meios para satisfazer as suas necessidades básicas (situação que ainda hoje se verifica).

Na perspectiva da social-democracia alemã, a qualidade de vida estava associada à possibilidade de liberdade humana, mas está só poderia ser garantida graças à solidariedade entre os homens. Nesse sentido, garantia um enriquecimento imaterial da existência.

Qualidade de vida na ideologia capitalista

Com o tempo, a ideia de qualidade de vida consolidou-se como um conceito ideologicamente subsidiário das economias capitalistas, por meio do qual as sociedades desenvolvidas do chamado “Primeiro Mundo” foram apresentadas —tomando a norte-americana como exemplo paradigmático— como um ideal para alcançar. Em contrapartida, o conceito também foi utilizado como instrumento de crítica aos modelos econômicos dos países socialistas da época, pois seriam incapazes de garantir os níveis de qualidade de vida que o aprofundamento das economias de mercado garantiria.

No entanto, apesar das diferentes abordagens, ficou demonstrado que a acumulação de riqueza por si só, expressão do progresso social nos termos do capitalismo, também não assegurava o bem-estar humano, o que se verificou a partir das crescentes desigualdades que impediram grandes setores da população de alcançarem à satisfação das suas necessidades.

Perspectiva sociológica da qualidade de vida

O conceito de qualidade de vida está fortemente ligado ao campo da sociologia, mas também faz parte do debate político ou das conversas cotidianas, estando associado ao nível de renda e conforto de uma pessoa, família ou grupo. Os sociólogos se ocupam em estudar a sociedade em algumas de suas dimensões sendo possível medir e avaliar a qualidade de vida baseando-se em uma série de dados estatísticos objetivos, os quais possibilitam extrair conclusões. Se um sociólogo deseja conhecer a situação de um determinado grupo, deve realizar uma série de pesquisas para coletar informações sobre aspectos objetivos e mensuráveis (nível de renda, acesso à água potável, tipo de veículo, eletrodomésticos, escolaridade, metros quadrados da habitação, tempo dedicado ao lazer, etc.). Os resultados obtidos fornecem informações muito úteis e servem para especificar o padrão de vida e estabelecer várias comparações (por exemplo, entre duas nações diferentes).

O sociólogo tem uma ideia aproximada da qualidade de vida, pois se baseia em certos dados estatísticos. No entanto, o sociólogo não consegue avaliar os aspectos subjetivos relacionados à qualidade de vida (satisfação pessoal ou valorização da própria existência). Pode ser que uma família tenha índices objetivos muito altos e, ao mesmo tempo, seja uma família infeliz. Esta dimensão ambivalente ocorre com alguma frequência, pois há localidades que se sentem muito felizes apesar de as suas condições de vida serem tecnicamente muito deficientes.

Na tentativa de estabelecer critérios científicos e rigorosos, os sociólogos usam diferentes medidas (alguns estudos se concentram na saúde, outros no bem-estar psicológico e outros nas condições sociais).

Uma proposta de qualidade de vida

Qualidade-VidaAlém da análise sociológica e da objetividade/subjetividade, é possível estabelecer uma série de circunstâncias que muito provavelmente poderiam ser consideradas como condições válidas para dizer que uma pessoa ou uma família desfrutem de uma boa qualidade de vida.

– Acesso a um sistema de saúde que permita enfrentar um problema de saúde.

– Acesso à educação generalizada para toda a população.

– Um nível mínimo de segurança para que os indivíduos não tenham a percepção de se sentirem ameaçados em seu cotidiano.

– Ter um nível mínimo de rendimento que garanta o acesso a bens básicos (alimentação, vestuário e energia elétrica).

– Circunstâncias sociopolíticas que permitem o exercício de liberdades básicas (por exemplo, liberdade de expressão ou liberdade religiosa) e corrupção política e econômica como algo excepcional e não o padrão usual.

As condições acima indicadas são uma referência, ou seja, uma proposta de orientação geral sem valor sociológico.

Segundo a mentalidade ocidental, é necessário medir qualquer realidade de forma objetiva e depois tirar uma série de conclusões. A medição de parâmetros é útil em muitos campos (especialmente na economia). No entanto, medir a qualidade de vida é uma ideia discutível e não isenta de controvérsias. As ferramentas sociológicas são válidas até certo ponto, pois não devemos esquecer que a cultura ocidental vive uma situação contraditória: níveis gerais aceitáveis se os compararmos com algumas áreas do planeta e, paralelamente, problemas sociais que questionam a suposta qualidade de vida (número crescente de pessoas com depressão, ansiedade ou que vivem em situação de marginalização e isolamento social). Por fim, a qualidade de vida como um valor numérico que se expressa em um ranking pode ser uma informação enganosa e, como exemplo, citar o Butão, um país muito pobre, mas que introduziu um novo parâmetro de medida: a felicidade interna bruta.

Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.

Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Março 2023). Conceito de Qualidade de Vida. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/qualidade-de-vida/. São Paulo, Brasil.

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