Conceito de Utopia

Lilén Gomez | Março 2023
Professora de Filosofia

Utopia é uma narrativa imaginária sobre as qualidades presentes em uma sociedade ideal para o bem do ser humano. Deriva das palavras gregas οὐ (ou) e τόπος (tópos), cuja conjunção pode ser traduzida como “lugar nenhum”. Em geral, o caráter utópico de uma doutrina ou de um projeto —quer esteja relacionado com um sistema político ou não— refere-se, por um lado, à sua idealidade e, por outro, à grande dificuldade que significaria colocá-lo em prática.

Como surge o conceito de utopia

O conceito de utopia como um espaço que não se encontra em lugar nenhum remonta à Grécia antiga, em textos platônicos como a República (século IV a.C.). No entanto, a versão desse termo com o que estamos mais familiarizados foi desenvolvida na Modernidade, no contexto do confronto político-religioso que atravessava a Europa por volta do século XVI. A ideia do utópico, nesta circunstância, inscreve-se — mais especificamente do que na Antiguidade — na tradição do pensamento político.

A princípio, a utopia foi associada aos primórdios do ser humano —por exemplo, em autores como Jean Jacques Rousseau (1712 – 1778) —, depois, após as Revoluções Burguesas, o conceito foi transformado para descrever a utopia como um modelo da sociedade que superasse as desigualdades da ordem social vigente. Adentrando a Modernidade, no século XIX, a utopia aparecerá vinculada à discussão em torno dos fundamentos do poder político, uma vez que perde sua justificação na divindade, após um processo geral de secularização da sociedade e de suas instituições.

A Utopia de Thomas More

O primeiro trabalho em torno da própria utopia foi o de Thomas More (1478 – 1535), que inventou o termo em sua obra denominada, justamente, Utopia (1516). O livro de More, que pode ser caracterizado como parte da escola de pensamento humanista renascentista, trata criticamente do funcionamento das instituições europeias e propõe, por meio de uma narrativa literária, a descrição de um sistema social em que a vida dos homens é ideal e isenta dos males econômicos, políticos e sociais que conhecemos. Para alcançar essa situação, devemos enfrentar as causas desses males e revertê-los. Na análise do autor, a primeira causa dos males —como o roubo e a fome— é dada pelo uso individual da propriedade privada.

Para More, a propriedade privada pode existir, mas seu uso deve ser público, ou seja, os bens devem estar à disposição de toda a comunidade. No entanto, a obra ergue-se, ao mesmo tempo, como uma justificação das relações coloniais que a Europa manteve com o resto do planeta, na medida em que sustenta que a conquista de outros territórios é um dever moral desde que existam neles terras não trabalhadas, pois isso é contrário aos desígnios de Deus, em virtude dos quais a terra deve ser explorada.

Do socialismo utópico ao socialismo científico

Uma versão posterior da utopia foi desenvolvida por volta do século XIX por autores pertencentes à corrente denominada socialismo utópico, que enfrentavam a classe social burguesa, principal responsável pela precariedade das condições de vida do proletariado. Socialistas utópicos —como Robert Owen (1771-1858), Charles Fourier (1772-1837), Saint Simon (1760-1825) — buscavam conseguir melhores condições materiais para os trabalhadores a partir de um modelo cooperativo de produção.

A proposta dos socialistas utópicos foi posteriormente criticada por Karl Marx (1818 – 1883) e Friedrich Engels (1820 – 1895), pois, na perspectiva deles, esses autores negavam a capacidade de ação do proletariado, considerando-o apenas como uma classe oprimida e não como classe revolucionária, capaz de realizar uma ação política de transformação social (que, nos termos de Marx, será a organização dos trabalhadores para a abolição das classes sociais).

Artigo de: Lilén Gomez. Professora de Filosofia, com desempenho em ensino e pesquisa em áreas da Filosofia Contemporânea.

Referencia autoral (APA): Gomez, L.. (Março 2023). Conceito de Utopia. Editora Conceitos. Em https://conceitos.com/utopia/. São Paulo, Brasil.

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